quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

BAUDELAIRE (2)



BAUDELAIRE
Em
Um comedor de ópio






“Mas a expansão dos sentimentos benevolentes causada pelo ópio não é um acesso de febre; é, antes de tudo, o homem primitivamente bom e justo, restaurado e reintegrado em seu estado natural, livre de todas as amarguras que tinham ocasionalmente corrompido seu nobre temperamento.

Enfim, por melhores que sejam os benefícios do vinho, pode-se dizer que ele passa freqüentemente perto da loucura ou pelo menos, da extravagância e que, além de um certo limite, ele volatiza, por assim dizer, e dispersa energia intelectual: enquanto o ópio parece sempre acalmar o que foi agitado e concentrar o que foi disseminado.

Resumindo, é a parte puramente humana, muitas vezes até a parte brutal do homem que, com o auxilio do vinho, usurpa a soberania, enquanto que o comedor de ópio sente plenamente que a parte purificada de seu ser e suas afeições morais gozam do máximo de flexibilidade e, sobretudo, que sua inteligência adquire uma lucidez consoladora e sem nuvens”.





BAUDELAIRE, Charles. Um comedor de ópio. Tradução de Annie Paulette Marie Canbe. Rio de Janeiro: Newton Compton Brasil ltda, s/data. Clássicos Econômicos Newton.

Sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Charles_Baudelaire

RABISCOS NO BLOCO


quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

BENJAMIN FRANKLIN



Benjamin Franklin
Em
Autobiografia






“Os grandes problemas do mundo: as guerras, as revoluções, etc., são promovidas e orientadas pelos partidos.
O objetivo dos partidos consiste no seu interesse imediato, ou naquilo que consideram como tal.
As divergências de pontos de vista entre estes diferentes partidos constituem a origem de toda a confusão.
Enquanto um partido se bate por um objetivo de caráter geral, cada indivíduo tem o seu interesse pessoal e particular em vista.
Tão depressa um dos partidos alcança o seu objetivo geral, cada membro passa a lutar pelo objetivo que particularmente lhe interessa e assim, indo contra o interesse dos outros, quebra o partido em pedaços e dá lugar a maior confusão.

Poucos são os indivíduos que, em política, agem movidos pelo simples desejo de bem servir o seu país, embora muitos afirmem que procedem movidos por este objetivo; e, se bem que os seus atos públicos possam redundar num benefício para o país, mesmo assim os homens públicos, acima de tudo, entendem que o seu benefício pessoal se identifica com o do seu país, e não procedem movidos pelo desejo de bem servir.

Menos são ainda os homens que, em política, agem tendo em vista o bem da Humanidade”.






FRANKLIN, Benjamin. “Autobiografia”. In. Ensaístas Americanos. Prefácio de Rone Amorim. Tradução de Sarmento de Beires e José Duarte. Rio de Janeiro/ São Paulo/ Porto Alegre: W. M. Jackson Inc. Editores, 1953.

Sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Benjamin_Franklin

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

BRINCANDO É QUE SE BRINCA


O VARAL DE IDÉIAS (Eduardo Lunardelli) nos indicou para ESCRITORES DA LIBERDADE, e o REFLEXÕES indica:

BLOG DO ZEZO
CLARAS EM CASTELO
SEI QUE EXISTES
UN - DRESS

EPICTETO (6)



EPICTETO



MÁXIMA 230

“Nada grande se faz de um golpe, nem maçã nem cacho de uvas.
Se me dizes: - Quero agora mesmo uma maçã, respondo-te: - Para isso é preciso tempo; espera que nasça, que cresça e amadureça.
E queres que o espírito frutifique de uma vez em toda a sua perfeita maturidade.
É justo?”


MÁXIMA 240

“O que nos prejudica em elevado grau é não sabermos de filosofia outra coisa senão o nome e querermos, não obstante, dar-nos ar de sábios, e pretender, imediatamente, ser úteis ao próximo como se tivéssemos de reformar o mundo.
Meu amigo reforma-te antes, e mostra depois aos outros um homem formado pela filosofia.
Comendo e passeando com eles, instrui-os com o teu exemplo; cede aos caprichos deles, suporta-lhes as esquisitices, trata-os com deferência e lhes serás útil”.





Epicteto: filósofo da escola dos estóicos, vivendo entre a Grécia e Roma nos meados do primeiro século da era cristã. Foi escravo, em Roma, na época de Nero.


EPICTETO. Máximas. Tradução de Alberto Denis. São Paulo: Ed. E Pub. Brasil Editora, 1960.

Sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Epiteto

VICENTE DO REGO MONTEIRO

Coleção particular


VENDEDOR DE FRUTAS

s/data – óleo sobre tela – 69 x 79 cm.
Autor: VICENTE DO REGO MONTEIRO

Sobre o autor:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Vicente_do_Rego_Monteiro

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

PLATÃO



Platão
Em
Diálogos III – A República







“ – E o povo sempre tem algum campeão que coloca à sua frente e cujo engrandecimento favorece?
- Sim, é o que costuma acontecer.
- É dessa raiz e não de outra que brota o tirano. Pois ele começa sempre como um protetor do povo.
- Evidente.
- De que modo principia então a transformar-se em tirano? Não é claro que ao fazer o que se atribui àquele homem na fábula sobre o templo de Zeus Liceu na Arcádia?
- Que fábula? – perguntou ele.
- Aquela, segundo a qual quem provasse uma entranha humana misturada com as de outras vítimas se converteria fatalmente em lobo. Nunca ouviste contar essa história?
- Ah! sim. Ouvi, como não!
- Pois o protetor do povo é como esse homem. Dispondo de uma multidão inteiramente dócil, não se abstém de derramar o sangue de seus compatriotas; em geral recorre a acusações injustas para arrastá-los aos tribunais e destruir-lhes as vidas, saboreando com a boca e a língua impuras o sangue fraterno; a uns mata e a outros exila, ao mesmo tempo que alude a abolição de dívidas e distribuições de terras. Qual poderá ser o destino de tal homem? Não tem ele por força de perecer às mãos de seus inimigos ou converter-se de homem em lobo, isto é, em tirano?”





PLATÃO. Diálogos III – A República. Tradução de Leonel Vallandro. Rio de Janeiro: Editora Technoprint S. A., s/data.

Sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Plat%C3%A3o

sábado, 26 de janeiro de 2008

AUGUSTO FREDERICO SCHIMIDT (3)



Momento
(Augusto Frederico Schmidt)






Desejo de não ser nem herói e nem poeta
Desejo de não ser senão feliz e calmo.
Desejo das volúpias castas e sem sombra
Dos fins de jantar nas casas burguesas.

Desejo manso das moringas de água fresca
Das flores eternas nos vasos verdes.
Desejo dos filhos crescendo vivos e surpreendentes
Desejo de vestidos de linho azul da esposa amada.

Oh! não as tentaculares investidas para o alto
E o tédio das cidades sacrificadas.
Desejo de integração no cotidiano.

Desejo de passar em silêncio, sem brilho
E desaparecer em Deus – com pouco sofrimento
E com a ternura dos que a vida não maltratou.






SCHMIDT, Augusto Frederico. Antologia Poética. Seleção de Waldir Ribeiro do Val. Introdução de Bernardo Gersen. Rio de Janeiro: Leitura, 1962.

Sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Augusto_Frederico_Schmidt

RABISCOS NO BLOCO


sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

OSCAR WILDE (11)



OSCAR WILDE
Em
A Balada do Cárcere de Reading
(trecho)





Soube tão só que torturante idéia
Lhe dava ao passo aquela pressa.
Porque olhava para o céu brilhante
Com tal olhar de ansiedade;
O homem matara aquela a quem amava
E assim teria de morrer.

Contudo os homens matam o que amam
Seja por todos isto ouvido,
Alguns o fazem com acerbo olhar,
Outros com frases de lisonja,
O covarde assassina com um beijo,
O bravo mata com punhal!

Uns matam seu amor, quando são jovens,
Outros quando velhos estão;
Com as mãos do Desejo uns estrangulam
Outros do Ouro com as mãos;
Os de mais compaixão usam a faca,
O morto assim logo se esfria.

Uns amam pouco tempo, outros demais;
Este o amor compra, aquele o vende;
Uns matam a chorar, com muitas lágrimas,
Outros sem mesmo suspirar;
Porque cada um de nós mata o que ama,
Mas nem todos hão de morrer.





WILDE, Oscar. A Balada do Cárcere de Reading. In.__________ Obra Completa. Tradução de Oscar Mendes. Rio de Janeiro: Editora José Aguilar, Ltda., 1961.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

GUY DEBORD



Guy Debord
Em
A Sociedade do Espetáculo





“As “sociedades frias” são aquelas que reduziram ao extremo a sua parte de história; que mantiveram num equilíbrio constante a sua oposição ao meio ambiente natural e humano, e as suas oposições internas.
Se a extrema diversidade das instituições estabelecidas para este fim testemunha a plasticidade da autocriação da natureza humana, este testemunho não parece evidente senão para o observador exterior, para o etnólogo vindo do tempo histórico.
O conformismo absoluto das práticas sociais existentes, às quais se encontram para sempre identificadas todas as possibilidades humanas, já não tem outro limite exterior senão o receio de tornar a cair na animalidade sem forma.
Aqui, para continuar no humano, os homens devem permanecer os mesmos”.





DEBORD, Guy. A Sociedade do Espetáculo. Tradução em português: www.terravista.pt/IlhadoMel/1540. Parafrase em português do Brasil: Railson Sousa Guedes.

Disponível em:
http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/socespetaculo.pdf

Sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Guy_Debord

VAN DONGEN

Art Gallery of the University of Rochester, New York


Portrait of a Woman
1903 – óleo sobre tela – 100 x 70 cm
Autor: Kees Van Dongen

Sobre o autor:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Kees_van_Dongen

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

FLORBELA ESPANCA (6)



AMOR QUE MORRE
(Florbela Espanca)




O nosso amor morreu...
Quem o diria!Quem o pensara mesmo ao ver-me tonta,
Ceguinha de te ver, sem ver a conta
Do tempo que passava, que fugia!

Bem estava a sentir que ele morria...
E outro clarão, ao longe, já desponta!
Um engano que morre... e logo aponta
A luz doutra miragem fugidia...

Eu bem sei, meu Amor, que pra viver
São precisos amores, pra morrer,
E são precisos sonhos para partir.

E bem sei, meu Amor, que era preciso
Fazer do amor que parte o claro riso
De outro amor impossível que há-de vir!




Disponível em:
http://users.isr.ist.utl.pt/~cfb/VdS/florbela.html

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

AUGUSTO COMTE



Augusto Comte
Em
Discurso Preliminar Sobre o Espírito Positivo






“Em uma palavra, a revolução fundamental que caracteriza o estado viril de nossa inteligência consiste em substituir por toda a parte a inacessível determinação das causas propriamente ditas, pela simples pesquisa das leis, isto é, das relações constantes que existem entre os fenômenos observados.
Quer se trate dos menores ou dos mais sublimes efeitos do choque e da gravidade, quer do pensamento e da moralidade, deles não podemos conhecer realmente senão as diversas ligações mútuas próprias à sua realização, sem nunca penetrar o mistério da sua produção”.

“Nossas especulações positivas devem não só confinar-se essencialmente, sob todos os aspectos, à apreciação sistemática dos fatos existentes, renunciando a descobrir sua primeira origem e o seu destino final, mas importa também ainda compreender que este estudo das fenômenos não deve tornar-se de qualquer modo absoluto, mas permanecer sempre relativo à nossa organização e à nossa situação”.

“Reconhecendo sob este duplo aspecto, como são imperfeitos os nossos meios especulativos, vemos que, longe de podermos estudar completamente qualquer existência efetiva, não poderemos sequer garantir a possibilidade de conhecer, mesmo de modo superficial, todas as existências reais, das quais a maior parte talvez nos deva escapar totalmente”.





COMTE, Augusto. Discurso Preliminar Sobre o Espírito Positivo. Tradução de Renato Barboza Rodrigues Pereira.

Disponível em:
http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/comte.pdf

Sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Auguste_Comte

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

FERNANDO PESSOA (8)



Bernardo Soares
Em
Autobiografia sem fatos





“Ora as costas deste homem dormem.
Todo ele, que caminha adiante de mim com passada igual à minha, dorme.
Vai inconsciente. Vive inconsciente.
Dorme, porque todos dormimos.
Toda a vida é um sonho.
Ninguém sabe o que faz, ninguém sabe o que quer, ninguém sabe o que sabe.
Dormimos a vida, eternas crianças do Destino.
Por isso sinto, se penso com esta sensação, uma ternura informe e imensa por toda a humanidade infantil, por toda a vida social dormente, por todos, por tudo”.





PESSOA, Fernando. Do Livro do Desassossego. Composto por Bernardo Soares.


Disponível em:
http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/vo000008.pdf

RABISCOS NO BLOCO


sábado, 19 de janeiro de 2008

BAKUNIN



Mikhail Bakunin
Em
Deus e o Estado





“Que a crença em Deus, criador, ordenador, juiz, senhor, amaldiçoador, salvador e benfeitor do mundo, tenha se conservado no povo, e sobretudo nas populações rurais, muito mais do que no proletariado das cidades, nada mais natural.
O povo, infelizmente, é ainda muito ignorante e mantido na ignorância pelos esforços sistemáticos de todos os governos que consideram isso, com muita razão, como uma das condições essenciais de seu próprio poder.
Esmagado por seu trabalho quotidiano, privado de lazer, de comércio intelectual, de leitura, enfim, de quase todos os meios e de uma boa parte dos estímulos que desenvolvem a reflexão nos homens, o povo aceita, na maioria das vezes, sem crítica e em bloco, as tradições religiosas.
Elas o envolvem desde a primeira idade, em todas as circunstâncias de sua vida, artificialmente mantidas em seu seio por uma multidão de corruptores oficiais de todos os tipos, padres e leigos, elas se transformam entre eles em um tipo de hábito mental, freqüentemente mais poderoso do que seu bom senso natural”.






BAKUNIN, Mikhail. Deus e o Estado. Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/cv000020.pdf

Sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Mikhail_Aleksandrovitch_Bakunin

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

LA FONTAINE



A GRALHA ENTRE OS PAVÕES
(La Fontaine – Trad. Curvo Semedo)





Pavão que andava na muda,
Sua plumagem largou,
E uma gralha presunçosa
Com ela o corpo adornou.

Entre um rancho de pavões
Atrevida se meteu,
Até que um dos camaradas
A impostora reconheceu.

Passou palra aos companheiros,
Que em cima dela saltaram,
E não só o adorno alheio,
Mas o próprio lhe tiraram.

Voltou para as companheiras,
Que do sucesso informadas,
A baniram do seu rancho
Ao som de mil apupadas.

O que sucedeu à gralha
Aos homens pode convir;
Aquele que alheio veste,
O vem na praça a despir.

Este caso, além do exposto,
Serve também de lição
A todos os que procuram
Parecer mais do que são.





Sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Jean_de_La_Fontaine


OLIVEIRA, Ary de (Seleção e Prefácio) Poesia – 1o. Volume. Rio de Janeiro/ São Paulo/ Porto alegre: W. M. Jackson Inc. Editores, 1950.

JACKSON POLLOCK

The Art Institute of Chicago

Greyed Rainbow
1953 – Óleo sobre linho – 182,9 x 244,2 cm
Autor: Jackson Pollock

Sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Jackson_Pollock

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

MATIAS AIRES



Matias Aires
Em
Reflexões Sobre a Vaidade dos Homens





“Trazem os homens entre si uma contínua guerra de vaidades; nenhum conhece a sua: a vaidade é um instrumento, que tira dos nossos olhos os defeitos próprios, e faz com que apenas os vejamos em uma distância imensa, ao mesmo tempo que expõem à nossa vista os defeitos dos outros ainda mais perto, e maiores do que são.
A nossa vaidade é a que nos faz ser insuportável a vaidade dos mais; por isso quem não tivesse vaidade, não lhe importaria nunca, que os outros a tivessem”.


“A imaginação desperta, e dá movimento à vaidade; por isso esta não é paixão do corpo, mas da alma; não é vício da vontade, mas do entendimento, pois depende do discurso.
Daqui vem, que a mais forte, e a mais vã de todas as vaidades, é a que resulta do saber; porque no homem não há pensamento, que mais o agrade, do que aquele, que o representa superior ao mais, e superior no entendimento, que é nele a parte mais sublime.
A ciência humana o mais a que se estende, é ao conhecimento de que nada se sabe: é saber o saber ignorar, e assim vem a ciência a fazer vaidade da ignorância”.





AIRES, Matias. Reflexões Sobre a Vaidade dos Homens. Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/me002989.pdf

Sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Matias_Aires

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

MANUEL BANDEIRA (9)



EPÍGRAFE
(Manuel Bandeira)




Ela entrou com embaraço, tentou sorrir, e perguntou tristemente – se eu a reconhecia?

O aspecto carnavalesco lhe vinha menos do frangalho de fantasia do que do seu ar de extrema penúria. Fez por parecer alegre. Mas o sorriso se lhe transmudou em ricto amargo. E os olhos ficaram baços, como duas poças de água suja... Então, para cortar o soluço que adivinhei subindo de sua garganta, puxei-a para ao pé de mim e, com doçura:

- Tu és a minha esperança de felicidade e cada dia que passa eu te quero mais, com perdida volúpia, com desesperação e angústia...




BANDEIRA, Manuel Estrela da Vida Inteira. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1979.

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

LEIBNIZ (2)



LEIBNIZ
Em
As Idéias


Os modos relativos ao pensamento.



Filaleto – A sensação é, por assim dizer, a entrada atual das idéias no entendimento através dos sentidos.

Quando a mesma idéia volta ao espírito, sem que o objeto externo que a gerou atue sobre os nossos sentidos, este ato do espírito se denomina reminiscência; se o espírito procura recordá-la e a encontra depois de algum esforço e a torna presente, temos o recolhimento.

Se o espírito a considera durante longo tempo com atenção, temos a contemplação; quando a idéia que temos no espírito flutua, por assim dizer, sem que o entendimento lhe preste atenção, é o que denominamos devaneio.

Quando refletimos sobre idéias que se apresentam por si mesmas, e as registramos, por assim dizer, na nossa memória, temos a atenção; e quando o espírito se fixa sobre uma idéia com muita aplicação, e a considera de todos os lados e não quer desviar-se dela apesar de outras idéias que lhe ocorrem, temos o estudo ou contenção de espírito..

O sono que não é acompanhado por nenhum sonho constitui a cessação de todas estas coisas; sonhar é ter essas idéias no espírito enquanto os sentidos externos estão fechados, de maneira que não recebem a impressão dos objetos externos com a vivacidade que lhes é comum. É ter idéias sem que elas nos sejam sugeridas por nenhum objeto de fora, ou por nenhuma ocasião conhecida, e sem que tais idéias sejam escolhidas ou determinadas de nenhuma forma pelo entendimento.

Quanto ao que chamamos êxtase, deixo o assunto a outros, se não for sonhar com os olhos abertos”.





LEIBNIZ, Gottfried Wilhelm. Novos ensaios sobre o entendimento humano. Tradução de Luiz João Baraúna. – 5a. ed. – São Paulo:Nova Cultural, 1992. – (Os pensadores) v.1.

Sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Gottfried_Leibniz

RABISCOS NO BLOCO


segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

CHUANG TZU (8)



TRÊS PELA MANHÃ
(Chuang Tzu)





Toda vez que gastamos nossas mentes, apegando-nos teimosamente a uma visão parcial das coisas, recusando a concórdia mais profunda entre este ou aquele contrário que o complementa, temos o chamado “três pela manhã”.
O que vem a ser esse “três pela manhã” ?

Um domador de macacos dirigiu-se a eles e disse-lhes: “Quanto às suas castanhas, vocês terão três quantidades pela manhã, e quatro à tarde”.
Ouvindo isso, os macacos ficaram com raiva.
Então, o domador lhes disse: “Está bem, neste caso, eu lhes darei quatro pela manhã e três à tarde”.
Ouvindo isso, os macacos ficaram satisfeitos.

As duas sugestões eram equivalentes, pois o número de castanhas não se alterava.
Mas, em uma delas os macacos ficavam descontentes e, na outra, ficavam satisfeitos.

O domador teve vontade de modificar a sua sugestão pessoal, de modo a satisfazer às condições objetivas.
E nada perdeu com isso!

O verdadeiro sábio, considerando todos os lados da questão imparcialmente, vê-los todos à luz do Tao.
A isto se chama seguir dois cursos de uma só vez.





CHUANG TZU, considerado o maior escritor taoista de cuja existência se tem notícia, escreveu sua obra no final do período clássico da filosofia chinesa, de 550 a 250 aC.

MERTON, Thomas. A Via de Chuang Tzu. Petrópolis: Editora Vozes, 1974.

sábado, 12 de janeiro de 2008

VINICIUS DE MORAES (5)



DIALÉTICA
(Vinicius de Moraes)




É claro que a vida é boa
E a alegria, a única indizível emoção
É claro que te acho linda
E em ti bendigo o amor das coisas simples
É claro que te amo
E tenho tudo para ser feliz


Mas acontece que eu sou triste...




MORAES, Vinicius de. Soneto de Fidelidade e outros poemas. 2 ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 1996.

ALICE NEEL


Hirshhorn Museum and Sculpture Garden, Washington D. C.

Kenneth Doolittle
1934 – aquarela e lapis sobre papel – 35,4 cm x 25,4 cm.
Autora: Alice Neel


Sobre a autora:

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

MAQUIAVEL (2)



Maquiavel
Em
O Príncipe



Capítulo XXIII – De que modo escapar aos aduladores Seções 1 e 2.



1 – Há um assunto importante que não quero omitir; é preciso que mencione um erro que os príncipes terão dificuldade em evitar se não forem muito prudentes ou se não escolherem bem.
Quero referir-me aos aduladores de que as cortes estão cheias.
Os homens têm tanto prazer e se iludem tanto com o que lhes diz respeito que só com dificuldade escapam à tal praga. Querendo dela se defender, correm o risco de se tornarem desprezíveis.
De fato, não há outra forma de se defender contra a adulação do que fazer as pessoas compreenderem que não há ofensa ao falar a verdade; mas quando todos podem falar a verdade a alguém, perdem-lhe o respeito.


2 – O príncipe prudente adotará, portanto, um terceiro caminho, escolhendo como conselheiros homens sábios, e dando-lhes inteira liberdade para falar a verdade, mas só quando interrogados, e apenas sobre o que lhes for perguntado.
O príncipe solicitará seu parecer sobre tudo, deliberando depois sozinho, do seu próprio modo.
O príncipe se conduzirá diante das assembléias de conselheiros, e com cada um deles, em particular, de modo tal que todos vejam que quanto maior a liberdade com que falarem, maior aceitação terão.
Afora estes, o príncipe não ouvirá ninguém mais; agirá com deliberação, mantendo com firmeza suas decisões.
Quem fizer outra coisa, ou agirá precipitadamente, devido aos aduladores, ou mudará muitas vezes de posição, por causa da variedade das opiniões ouvidas – e em qualquer caso provocará a falta de respeito.




MAQUIAVEL, N. O Príncipe.Tradução de Pietro Nassetti São Paulo: Editora Martin Claret, 2002.

Sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Nicolau_Maquiavel

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

OMAR KHÁYYÁM (2)



OMAR KHÁYYÁM
Em
Rubáyát





122

Cansado
de interrogar
em vão os homens e os livros,
interroguei a taça.

Colei os meus lábios aos
seus lábios e murmurei:

“Para onde irei,
depois de morto?”

E a taça me respondeu:
“Bebe na minha boca.

Bebe longamente.

Não volverás jamais a este mundo”.




127

Ignaro, que
cuidas ser sábio,
vejo-te sufocado entre
o infinito do passado
e o infinito do futuro.

Bem quiseras por um limita
entre esses infinitos
e parar...

Vai antes sentar-te
à sombra de uma árvore,
perto de uma ânfora de vinho,
que esquecerás a tua
impotência.




KHÁYYÁM, Omar. Rubáiyát. Versão portuguesa de Otávio Tarquínio de Souza. 14a.ed. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1969.

Sobre o autor:
http://en.wikipedia.org/wiki/Omar_Khayy%C3%A1m

RABISCOS NO BLOCO


quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

EINSTEIN (2)



Albert Einstein
Em
AFORISMOS PARA LEO BAECK





“O homem habitualmente evita reconhecer inteligência em outro, a não ser quando, por acaso, se trata de um inimigo”.

“Poucos seres são capazes de dar bem claramente uma opinião diferente dos preconceitos de seu meio. A maioria é mesmo incapaz de chegar a formular tais opiniões”.

“A maioria dos imbecis permanece invencível e satisfeita em qualquer circunstância. O terror provocado por sua tirania se dissipa simplesmente por sua distração e por sua inconseqüência”.

“Para ser um membro irrepreensível de uma comunidade de carneiros, é preciso, antes de tudo, ser também carneiro”.

“A alegria de contemplar e de compreender, eis a linguagem a que a natureza me incita”.




EINSTEIN, Albert. Como vejo o mundo. Tradução: H. P. de Andrade. São Paulo: Circulo do Livro, s/data.

Sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Albert_Einstein

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

CRUZ E SOUSA

ÊXTASE
(João da Cruz e Sousa)




Quando vens para mim, abrindo os braços
Numa carícia lânguida e quebrada,
Sinto o esplendor de cantos de alvorada
Na amorosa fremência dos teus passos.

Partindo os duros e terrestres laços,
A alma tonta, em delírio, alvoroçada,
Sobe dos astros a radiosa escada
Atravessando a curva dos espaços.

Vens, enquanto que eu, perplexo d’espanto,
Mal te posso abraçar, gozar-te o encanto
Dos seios, dentre esses rendados folhos.

Nem um beijo te dou! abstrato e mudo
Diante de ti, sinto-te, absorto em tudo,
Uns rumores de pássaros nos olhos.




CRUZ E SOUSA, João da. A POESIA INTERMINÁVEL DE CRUZ E SOUSA.
Disponível em:

http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=2101


Sobre o autor:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Cruz_e_Sousa

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

LA BRUYÈRE (8)



La Bruyère


Da Sociedade e da Conversa




32. “Nem sempre a boa educação inspira a bondade, a eqüidade, a condescendência, a gratidão; mas toma ao menos esse aspecto e apresenta o homem no seu exterior como deveria ser em seu íntimo.

Pode-se definir a essência da boa educação, mas não se pode fixar sua prática: segue o uso e costumes transmitidos; está ligada ao tempo, aos lugares, às pessoas, e não é igual para os dois sexos, mesmo em condições diversas.
A inteligência, só por si, não a cria: leva-nos apenas a copiar e a aperfeiçoar seus ditames.
Há pessoas que nascem para ser bem educadas; há outras cuja superioridade se reflete em seu grande talento ou em sua sólida virtude.
É verdade que as boas maneiras realçam o valor, tornando-o agradável; e que são necessárias qualidades eminentes para ser tolerado sem boas maneiras.

Parece-me que o espírito da boa educação é certo cuidado para que, por nossas palavras e maneiras, os outros se sintam contentes consigo mesmos e conosco”.





LA BRUYÈRE, Jean De. Caracteres. Tradução de Antonio Geraldo da Silva. São Paulo: Escala, s/data.

HODLER


The Art Institute of Chicago


James Vibert, Sculptor
1907 – oleo sobre tela – 64,7 cm x 66 cm.
Autor: Ferdinand Hodler

Sobre o autor:

sábado, 5 de janeiro de 2008

STANISLAW PONTE PRETA (3)



Stanislaw Ponte Preta
Em
Máximas Inéditas De Tia Zulmira





“Desconfie sempre dos propósitos de associações tipo “Liga da Decência”, “Associação dos Pais de Família” e outras do mesmo gênero, metidas a reformar os outros.
Quem tem a consciência tranqüila não precisa entrar para clube nenhum.
A consciência é como a vesícula: a gente só se preocupa com ela quando dói”.


“Se você não acredita que o reino do Céu é aqui, repare então como os pobres de espírito se divertem”.


“O ideal seria se os moços soubessem como sabem os velhos e se os velhos pudessem como podem os moços”.


“Alguns paradoxos são perfeitamente compreensíveis.
Há homens, por exemplo, que vestem uma mulher para ter o direito de vê-la nua”.


“A diferença entre um cafajeste mastigando e um boi ruminando está no ar distinto e no olhar inteligente do boi”.





PONTE PRETA, Stanislaw. Máximas Inéditas De Tia Zulmira. Desenhos de Jaguar. Prefácio de Sergio Cabral. Rio de Janeiro: Editora Codecri, 1976.

Sobre o autor:

http://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A9rgio_Porto

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

THOREAU (2)



Henry Thoreau
Em
A DESOBEDIÊNCIA CIVIL





“Aceito com entusiasmo a divisa: “O melhor governo é o que menos governa”; e gostaria de vê-la posta em prática mais pronta e sistematicamente.
Levada a cabo, ela equivale a isto, em que também acredito: “O melhor governo é o que não governa de modo nenhum”; e quando os homens estiverem preparados para ele, será a espécie de governo que terão.
No melhor dos casos, o governo é apenas uma conveniência; entretanto, a maior parte dos governos, habitualmente, e todos os governos, por vezes, são inconvenientes.
As objeções que têm sido levantadas contra um exército permanente – e elas são muitas e poderosas, e merecem prevalecer – podem também, ao fim e ao cabo, ser levantadas contra um governo permanente.
O exército permanente é apenas um ramo do governo permanente.
O próprio governo, que não passa de um modo escolhido pelo povo para o cumprimento de sua vontade, está igualmente sujeito a ser mal empregado e pervertido antes que o povo possa agir por seu intermédio”.


“Jamais haverá um Estado realmente livre e esclarecido enquanto o Estado não venha a reconhecer o indivíduo como o poder mais alto e independente, do qual se origina todo o seu próprio poder e autoridade, e tratá-lo correspondentemente”.





THOREAU, Henry David. A Desobediência Civil e outros ensaios. Seleção, tradução, prefácio e notas de José Paulo Paes. 9a. Ed. São Paulo: Editora Cultrix, 1993.

Sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Henry_David_Thoreau

RABISCOS NO BLOCO


quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

CASSIANO RICARDO (2)



Canção do Medo
(Cassiano Ricardo)




A vida está sempre escondida
no seu grande, seu feroz segredo.
Não é a morte que me põe medo;
é a vida.

Fere-me ouvir, durante a noite,
o meu coração funcionando...
Pobre coração errado
culpado da minha alegria.
Parece que o ouço, algum dia,
como um músculo que soluça
já retirado do meu peito
e ainda vivo, sobre a mesa,
para alguma experiência russa.
Não é a morte que me intimida,
é a vida.

Não há nada que me desoerte
maior temor do que o destino.
O que está por acontecer.
O mistério que nos irmana
(por qualquer coisa de divino)
a outra criatura humana.

Destino, noturno destino
que sabemos estar nos espiando
como um misterioso conviva
pelo olhar da pessoa viva.
Não é a morte que me amedronta;
é a vida.

Há uma rosa rubra, é a rosa
de sangue que ficou na calçada,
depois da fúria homicida.
As rosas que eram cor-de-rosa
agora estão brancas de medo.
Não é a morte que me põe medo;
é a vida.




CASSIANO RICARDO. Antologia Poética.Seleção de Rubem Braga. Rio de Janeiro: Editora do Autor, 1964.

Sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Cassiano_Ricardo

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

NIETZSCHE (11)



Friedrich Nietzsche
Em
Crepúsculo dos Ídolos





“Reduzir uma coisa desconhecida a outra conhecida alivia, tranqüiliza e satisfaz o espírito, proporcionando, além disso, um sentimento de poder.
O desconhecido comporta o perigo, a inquietude, o cuidado – o primeiro instinto leva a suprimir essa situação penosa.
Primeiro princípio: uma explicação qualquer é preferível a falta de explicação.
Como, na realidade, se trata apenas de se livrar de representações angustiosas, não se olha de tão perto para encontrar os meios de chegar a isso: a primeira representação, pela qual o desconhecido se declara conhecido, faz tão bem que “é considerada por verdadeira”.
Prova do prazer (“da força”) como critério da verdade.
O instinto de causa depende, pois, do sentimento do medo que o produz.
O “porquê”, desde que possível, não exige a indicação de uma causa por amor a ela, mas sim uma espécie de causa – uma causa que tranqüilize, liberte e alivie.
A primeira conseqüência dessa necessidade é que se fixa como causa algo já conhecido, vivido, alguma coisa que está inscrita na memória.
O novo, o imprevisto, o estranho está excluído das causas possíveis.
Não se busca, portanto, somente descobrir uma explicação da causa, mas sim se escolhe e se prefere uma espécie particular de explicações, aquela que dissipa mais rapidamente e com mais freqüência a impressão do estranho, do novo, do imprevisto – as explicações mais usuais.
-O que é que se segue disso?
Uma avaliação das causas domina sempre mais, se concentra em sistema e acaba por predominar a ponto de excluir simplesmente outras causas e outras explicações.
- O banqueiro pensa imediatamente no “negócio”, o cristão no “pecado”, a moça no seu amado”.




NIETZSCHE, F. Crepúsculo dos Ídolos – ou como filosofar a marteladas. Tradução de Carlos Antônio Braga. São Paulo: Escala, s/data.